sexta-feira, 29 de junho de 2018

Comunicação entregue em Bruxelas ao eurodeputado José Manuel Fernandes em 2018-05-17



Exmo Sr.  Eurodeputado José Manuel Fernandes.

Faço parte de um grupo de empresários e técnicos de Transportes que se encontram preocupados com a possibilidade de Portugal poder não vir a executar a sua parte do Corredor Atlântico (a amarelo, no mapa anexo), que é um dos 9  Corredores Trans-Europeus que constituem o "core network" da rede ferroviária europeia, a ficar concluída até 2030, a primeira das 2 metas temporais referidas no Livro Branco dos Transportes na UE.  A segunda meta será para a rede complementar, que ficar concluída até 2050.


Esta rede visa a completa interoperabilidade ferroviária entre todos os países europeus, melhorando a coesão e reduzindo custos, nomeadamente energéticos (a Europa tem insuficiente produção de combustíveis fósseis) e ambientais, bem como a perigosidade nas estradas, retirando-lhes tráfego pesado 
Reconhecendo que a construção desta rede tem custos elevados e que sem uma forte ajuda da UE tal rede dificilmente poderia ser concluída dentro do prazo previsto ou mesmo nem sequer chegaria a ser concluída, foram constituídos fundos europeus específicos para apoiar a sua concretização, como é o caso do CEF - Connecting Europe Facility.  No presente QCA 2014-2020, o montante do co-financiamento para os países candidatáveis aos fundos de Coesão (caso de Portugal) pode atingir os 85 % do custo das obras, sendo de 40 % o limite para os restantes países.
Por razões que se desconhecem, Portugal ainda nao iniciou a sua parte do Corredor Atlântico  nem se conhecem planos para começar e completar a sua execução até 2030.
Com efeito, o único documento até agora divulgado pela entidade gestora da sua rede ferroviãria e rodoviária (Infraestrutuas de Portugal) e cujo original em português se anexa apenas menciona começar a colocar intercambiadores fronteiriços, tanto no ramo internacional norte como no ramo internacional sul, após a chegada da bitola europeia a essas fronteiras, ou seja, após 2023.

        
          

Ora, isto indicia que a sua intenção é continuar a utilizar as actuais linhas de via única e bitola ibérica e reconvertê-las mais tarde em bitola europeia, apesar das condições dos seus traçados centenários não serem as adequadas para as prestações exigíveis aos novos tráfegos ou de ser extremamente caro a sua adaptação, acrescendo que, a não ser a via rodoviária, não se vê qualquer alternativa para o tráfego ferroviário enquanto tais linhas, devido a serem em via única, estiverem a ser modificadas, o que cerecerá de nuitos meses de inactividade.   Seria mais rápido, mais barato e mais funcional construir linhas novas, como Espanha está a fazer, em vez de adaptar as de bitola ibérica existentes com os problemas que já têm.

      



Mais grave ainda é o facto de a 3ª fase de tal plano estar pensada “a muiito longo prazo” e não completar o Corredor Atlântico, dado não contemplar a chegada de nenhum destes 2 eixos internacionais a qualquer porto marítimo, limitando-se a fazê-los terminar em vários intercambiadores de interface com a rede de bitola ibérica existente, resulatndo uma quebra de interoperabilidade impeditiva de qualquer comboio europeu completar o seu percurso no Corredor Atlântico e mantendo, por isso, uma inaceitável situação de monopólio para os operadores da bitola ibérica, salvaguardando-os da concorrência internacional.
     
Resumindo, Portugal tem passado ao lado dos generosos fundos europeus disponíveis e é o único País que ainda não deu um passo no sentido da interoperabilidade ferroviária, satisfazendo-se com algumas melhorias pontuais na sua centenária rede ferroviária ainda de bitola (distância entre os carris) ibérica, que é cerca de 24 cm mais larga do que a bitola europeia (veja figura ilustrativa que se segue).  Ao contrário, Espanha, igualmente com a rede principal em bitola ibérica, tem desde há largos anos vindo a construir novas linhas (a travessia dos Pirinéus, na Catalunha, já está em serviço desde 2014) e já anunciou que terá concluída a sua parte do Corredor Atlântico até 2023.

                          

Corremos, assim, um elevado risco de não completar em devido tempo o Corredor Atlântico e de Portugal se poder tornar na única ilha ferroviária da Europa Ocidental, ficando sujeito aos custos de transbordo, fronteiriço ou interno, vendo agravada a sua situação de País periférico e prejudicada a sua competitividade relativamente ao mercado europeu. Neste caso, Portugal não só ficaria na completa dependência das plataformas logísticas espanholas como nas mãos do monopólio dos operadores ferroviários de bitola ibérica, dado não poder haver concorrência internacional.  E nenhuma empresa quereria vir a instalar-se ou a trabalhar em Portugal, com tais condicionamentos.
Pelas mesmas razões técnicas, a Europa não teria acesso fácil aos vários portos da costa atlântica portuguesa, junto à qual passa um intenso tráfego marítimo intercontinental e de longo curso, como ilustra o diagrama seguinte.


É, pois, do interesse tanto de Portugal como da UE construir e completar o mais rápido possível o Corredor Atlânfico na sua versão actual, para concretizar os objectivos propostos.
Vejamos então qual o estado actual dos estudos ou projectos de cada uma das 3 linhas (ou eixos) que compõem o traçado nacional do Corredor Atlântico :


1) Eixo internacional sul
O troço Poceirão.Caia (fronteira) dispõe de projecto completo e já adaptado de acordo com as mesmas características da linha que lhe dá continuidade em Espanha até Madrid, de via dupla e classificada como uma linha de Altas Prestações, servindo simultaneamente para serviço AV de passageiros e para serviço de mercadorias.  Cumpre com as especificações eusopeias de interoperabilidade (electrificação a 25 kV, ERTMS, comboios com 750 m, etc).
0 projecto foi feito pelo consórcio ELOS e custou (ou vai custar) cerca de 150 M€. 
A obra, estimada em 1100 M€, já teve os necessários  financiamentos assegurados e até foi adjudicada, mas acabou por vir a ser suspensa.
A conveniente extensão da bitola europeia à estação de Pinhal Novo, à fábrica da Autoeuropa e aos portos de Sines e de Setúbal é rápida e simples, uma vez que nestes troços de bitola ibéria mas de bom traçado a plataforma é de via dupla em quase todo o percurso, o que facilita a transição para a bitola europeia.
Os comboios internacionais de passageiros Madrid-Lisboa, enquanto não houver uma nova travessia do rio Tejo, poderão chegar a Entrecampos, no centro de Lisboa, utilizando a actual linha que atravessa pela Ponte 25 de Abril, desde que sejam de eixos telescópicos e instalado um intercambiador no Pinhal Novo.
Para os passageiros, o principal interface entre a rede de bitola ibérica e a de bitola europeia seria na estação de Pinhal Novo.
O serviço de mercadorias passaria a contar com a prevista Plataforma Logística do Poceirão que também asseguraria o interface de mercadorias entre ambas as redes.
Para atingir todas estas potencialidades funcionais, o custo global situar-se-á nos 1700 M€.


2) Eixo internacional norte
Esta linha, também designada por “Aveiro-Vilar Formoso” ainda não dispõe de projecto, mas existem estudos sobre várias alternativas parcelares do seu traçado.  Será importante que esta nova linha sirva as instalações da fábrica da PSA (veículos automóveis e furgões), em Mangualde


Em função do que possa vir a ser o projecto de execução, estima-se que o seu custo se possa situar na ordem dos 5000 M€.
Alertamos, porém, para a intenção publicamente divulgada popr Espanha de ir candidatar ao próximo QCA 2021-2027 uma extensão do Corredor Atlântico até aos portos da Galiza, o que poderá limitar ou mesmo eliminat o interesse da UE em co-financiar este nosso eixo, dado ser praticamente paralelo ao da Galiza.

3) Eixo costeiro
Apenas existem alguns ensaios sobre o seu traçado, que deverá contemplar também uma nova travessia do rio Tejo, em ponte ou em túnel imerso no leito do rio, apontando-a para o nó do Poceirão.
Esta linha, além de dever assegurar a interligação entre os portos da costa atlântica, deverá possibilitar o descongestionamento da actual Linha do Norte, entre Lisboa e Porto.
O seu preço dependerá muito das condições do seu traçado e da funcionalidade requerida, pelo que só muito grosseiramente se poderá apontar um valor, possivelmente na ordem dos 4500 M€, excluindo a travessia do Tejo.


Ora, estando ainda a decorrer as negociações dos próximos fundos europeus, parece ser esta a ocasião adequada para alertar as várias autoridades para este assunto.

Bruxelas, 17 de Maio.de 2018

                                                          Luís Cabral da Silva,
                                                                      Engº , Espec. Em Transportes e Vias de Comunicação
                                                                                          luis.c.silva.01@gmail.com
                                                                                            Tlm. +351 918240188



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