Manifesto
PORTUGAL – UMA ILHA
FERROVIÁRIA NA UNIÃO EUROPEIA
Portugal em breve irá ficar isolado do resto
da Europa comunitária, tornando-se numa ilha ferroviária, já que os comboios
nacionais não irão poder prosseguir por terras de Espanha porque do lado de lá as
linhas irão ter distâncias entre os carris (bitolas) diferentes e sistemas
operativos igualmente distintos das linhas portuguesas.
Como consequência da política seguida
pelos sucessivos governos portugueses, um comboio de mercadorias ou um comboio de passageiros não poderão prosseguir a sua marcha para fora
de Portugal, ficando retidos na fronteira, porque a Espanha tem renovado a sua
rede ferroviária e adoptou os critérios europeus de interoperabilidade e
Portugal não.
Em
consequência, se nada for implementado brevemente, o nosso País ficará completamente isolado da União Europeia em
termos ferroviários, ficando dependente dos “portos secos” de Vigo, Salamanca e
Badajoz em Espanha e das vias marítima e rodoviária.
As consequências económicas serão graves, pois
iremos diminuir a nossa competitividade, o que nos tornará ainda menos
atractivos quer para o investimento nacional quer para o estrangeiro.
Portugal tem uma rede centenária a
precisar de uma renovação importante, com linhas velhas que possuem características
técnicas completamente desajustadas em relação ao que se pratica no Mundo
actual. Os planos de investimento ferroviário, anunciados pelos vários
governos, mais não são do que meros trabalhos de manutenção ou de modificação
pontual. São “simples remendos” como já ficou demonstrado com o paradigmático
projecto de “Modernização da linha do Norte”. Gasta-se o dinheiro público, que
é de todos nós, em melhoramentos e obras pontuais e, no final, fica-se à mesma
com linhas que se mantém obsoletas e que não correspondem às nossas
necessidades e ao que se deseja para o Presente e o Futuro do País.
Portugal e a nova Rede
Ferroviária Europeia (RTE-T)
Portugal não se tem empenhado na construção da
vertente ferroviária das redes transeuropeias de transportes (RTE-T) que nos
permitiria, com as novas linhas de bitola europeia projetadas para tráfego
misto, ligações directas com toda a Europa, o nosso principal parceiro
comercial, sem ficarmos obrigados aos custos e aos tempos de transbordo nas plataformas
logísticas espanholas de Vigo, Salamanca e Badajoz. Se nada for feito, tornar-se-ão numa espécie de alfândegas a que as
nossas importações e exportações ficarão sujeitas.
A
alternativa terrestre continuará pois a ser para Portugal, apenas a do
transporte rodoviário de longo curso, cujo futuro sabemos limitado por razões
energéticas, ambientais, de congestionamento e de segurança das estradas,
factores agravados por custos adicionais de operação como taxas, horários e
todo o tipo de regulamentos destinados a dificultar o atravessamento de alguns
países europeus. Assim a dependência da rodovia tornar-se-á um obstáculo ao
investimento estrangeiro em Portugal e ao desenvolvimento da economia
portuguesa. A alternativa marítima, mais lenta e morosa, oferece piores
condições de frequência, rapidez e fiabilidade que as vias terrestres , para
além de ser muito menos eficiente na ligação aos mercados mais afastados da
orla costeira da Europa onde se situam muitas
das principais indústrias e centros de consumo.
Esta é a razão porque a União
Europeia definiu uma rede transeuropeia de transportes, ligando entre si as
principais cidades, portos, aeroportos e plataformas logísticas (nós da rede) com
a criação de 9 Corredores Transeuropeus.
O Corredor Atlântico (a amarelo no mapa) é vital para o futuro da
competitividade da economia portuguesa
Como
se pode ver no mapa, a rede ferroviária transeuropeia prevê duas ligações
internacionais essenciais para Portugal, a Norte a linha Aveiro-Vilar Formoso e
a Sul a linha Sines/Lisboa – Badajoz, complementadas com a linha litoral Sines/Lisboa-Porto/
Leixões. Para isso a UE disponibilizou fundos para comparticipar na respectiva
construção, tanto no QCA 2007-2013 como no actual QCA 2014-2020, sendo que
neste a comparticipação a fundo perdido, dentro de certos limites, atingiria os
85%. Portugal pouco ou
nada fez para conseguir essas verbas comunitárias. Nem chegou a apresentar
projectos de engenharia necessários para viabilizar a formalização das
candidaturas. O único projecto que chegou mais longe foi a ligação Sul entre
Lisboa e a fronteira espanhola em Badajoz, projecto ferroviário Poceirão-Caia,
mas onde não se construiu sequer um metro de linha em bitola europeia já que há
um litígio jurídico de 150 milhões de Euros com o consórcio ELOS, a
quem fora adjudicado o trabalho, pois um novo governo decidiu abandonar
pura e simplesmente a implementação física da bitola europeia.
Entretanto,
os projectos já aprovados para as actuais linhas portuguesas não resolvem
minimamente a situação, pois que as ligações à Europa terão de ter
INTEROPERABILIDADE FERROVIÁRIA, ou seja, terem as mesmas
características técnicas das redes transeuropeias, designadamente a bitola europeia
(1435 mm), a electrificação (25KV) os sistemas de comunicação (GSM-R) e
de sinalização e controlo (ERTMS) e traçados compatíveis com comboios de
mercadorias de 750 metros. Só deste modo as composições ferroviárias
poderão circular em território nacional e na Europa a velocidade elevada, sem
necessidade de haver transbordos (de passageiros ou de mercadorias), ou seja,
sem haver roturas de carga em qualquer ponto do trajecto. Tal como já acontece na restante Europa, os nossos comboios de
mercadorias de tracção eléctrica deveriam ter 750 metros de comprimento,
circulando até 120 km/h.
Ora,
com excepção da electrificação a 25 KV, nada disto existe na nossa mais que centenária
rede de bitola ibérica (1668 mm) a
qual, salvo na linha do Norte e nas suburbanas, é de via única o que, aliado à
insuficiente capacidade nos itinerários de grande tráfego como são os do
Corredor Atlântico, torna muito caras e demoradas quaisquer obras de
modernização com as linhas em funcionamento, além das condições do traçado não
serem as desejáveis, tais como elevados declives (pendentes).
Em
consequência, o futuro logístico de Portugal e sua ligação à Europa, implicam a
construção de linhas novas, eventualmente aproveitando alguns troços existentes
de acesso a polos nacionais importantes e sempre que isso não comprometa o
objectivo essencial de ligações modernas à União Europeia.
Neste contexto, Portugal terá de
conviver, durante algumas décadas, com duas redes ferroviárias com bitolas
diferentes, mas com pontos comuns (portos, estações e plataformas logísticas).
Aliás,
o mesmo acontece em Espanha, com a diferença de que a Espanha programou o seu
futuro com tempo e aproveitou sempre ao limite os fundos europeus, avançando
com uma nova rede em bitola europeia há já 29 anos, a crescer em bom ritmo em
direcção à Europa e a chegar brevemente à nossa fronteira. A travessia pela
orla Mediterrânica dos Pirenéus já está activa desde 2014, data em que o porto
de Barcelona passou a operar em duas bitolas. A travessia pela orla Atlântica,
em Irún, deverá estar concluída até 2020. Assim que a bitola europeia estiver
nos principais portos e plataformas logísticas de Espanha, é previsível que
desapareçam do tráfego rodoviário mais de 30.000 camiões pesados que
diariamente atravessam os Pirenéus e surjam todo o tipo de obstáculos e
de custos para países que, como Portugal, não se prepararam a tempo.
Note-se também que os Estados
Membros da UE, incluindo Portugal, comprometeram-se a construir os eixos
principais nacionais do Corredor Atlântico, em bitola europeia, até 2030 e
Portugal ainda não construiu 1 metro de Linha em bitola europeia nem se sabe
quando começará.
A situação torna-se
ainda mais grave pelo facto da Espanha ter planos para encerrar as suas antigas
linhas de bitola ibérica que se ligam ao nosso País, conforme um estudo
promovido pelo Ministério do Fomento e divulgado em 2013 (XXVI Cimeira luso-espanhola, de 13 de Maio de 2013). Quando esses planos
forem executados, os nossos comboios chegarão à fronteira espanhola e não poderão
continuar para o lado de lá, porque a rede e os sistemas operativos são
diferentes, e terão de utilizar os portos secos espanhóis criados juntos à
nossa fronteira para os necessários transbordos. E assim, por tais razões, Portugal está prestes a tornar-se numa ilha
ferroviária na União Europeia, uma “jangada de pedra” perdida no canto Sudoeste
da Europa.
CONCLUSÃO: Em termos ferroviários, Portugal irá ficar isolado da UE, com
consequências económicas bastante graves, uma vez que se tornará cada vez menos
atraente para o investimento industrial, quer nacional quer estrangeiro. O
nosso País ficará muito dependente dos portos secos de Vigo, Salamanca e
Badajoz do país vizinho e os nossos portos
terão um crescimento muito limitado.
Vamos deixar que a dependência de Portugal se torne
irreversível?
Esta é a questão que colocamos aos nossos responsáveis
políticos e à nossa sociedade civil em geral.
Portugal, junho de 2017
Os signatários
Alfredo Marvão Pereira economista
António Cerdeira Baptista engenheiro, ex-diretor coordenador no ML
António Cerveira Pinto analista político
António Curto economista
António Gomes Marques bancário
António José Coelho empresário
António José Mocho empresário, gestor
António
Leite Marques empresário
Armando
Ramalho de Almeida engenheiro eletrotécnico, IST
Carlos
Alberto Chambel Santos bancário
Carlos
Mendes Jorge engenheiro aeronáutico
Eduardo
Pessoa Santos eng.mil/civil(AM/IST)esp.aerod/aerop.p-gr.SHST
Eugénio
Menezes de Sequeira investigador
coordenador, conselheiro
Fernando
Santos e Silva eng.elet.IST, especialista em transportes
Fernando
Teixeira Mendes empresário, gestor
de empresas
Francisco
Batel Marques professor universitário
Henrique
Cabral da Silva
engenheiro, co-fundador do EIM
Henrique
Neto empresário
Jorge
Paulino Pereira prof.vias
com.e transp.(IST,UnivLisboa),consultor
José
António Girão professor jubilado,
FE/UNL
José
Manuel Consiglieri Pedroso engenheiro, ex-sec.Estado transportes
José
Osvaldo Bagarrão engenheiro,
ex-diretor mat.circulante no ML
José
Pereira Coutinho especialista em transporte aéreo
Luis Cabral da Silva engenheiro,
especialista em transportes
Luis Mira Amaral engenheiro, economista
Luis
Reis Torgal professor catedrático
Manuel
de Pinho Vaz da Silva
engenheiro, MBA econ. e finanças UNL
Mário
Gomes Ribeiro eng.mec.IST
Mário
Lopes eng.civil, professor do IST
Patrick
Monteiro de Barros empresário
Pedro
Sena da Silva engenheiro
Pedro
Vazão de Almeida engenheiro, ex-diretor operação no
ML
Rómulo
Machado advogado
Rosalina
Pires Marques empresária
Rui
Rodrigues consultor em transportes
Teresa
Sá e Melo investigadora
Ventura
Leite economista
Victor
Neves arquitecto
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