Dear Commissar for Transportation
Adina ValeanLisbon, 30 July 2020
Please find attached a letter subscribed by 29 portuguese citizens of
several areas, namely engineers, business leaders, and mayors of major
towns, relatively to the gauge of the rail infrastructure of the TEN-T
in Portugal and the risk of isolation of the Portuguese economy.
There is an ongoing debate in Portugal about the plan the government
needs to present to the EU Commission in the framework of the recovery
plan and use of EU Funds on the post Covid 19 period. This includes
investment on new rail infrastructures, in which the issue of this
letter is crucial to distinguish waste from investment.
We ask for your attention to the contents of this letter and for an
answer.
With best regards
Exma.
Senhora
Comissária
dos Transportes
Adina
Valean
Email: cab-valean-contact@ec.europa.eu
Address: Rue de la Loi / Wetstraat 200
1049 Brussels
Belgium
Lisboa,
30 de Julho de 2020
Assunto:
Risco de isolamento da economia portuguesa - pedido de esclarecimento sobre a
componente ferroviária das TEN-T em Portugal
Tomámos
conhecimento da apresentação que fez no Parlamento Europeu, no dia 23 de Junho,
sobre o ponto de situação da consulta pública do novo TEN-T.
Saudamos,
em particular, dois aspectos do seu discurso:
Primeiro,
a satisfação com que registou a participação de 600 organizações e cidadãos, e
a valorização da informação recebida por essa via, o que nos encorajou agora a
escrever-lhe esta carta.
Segundo,
o alerta que deixou para o perigo de as regiões periféricas ficarem de fora desta
reforma, o que implicaria o agravamento de desequilíbrios económicos e sociais
no interior do espaço europeu.
Como
cidadãos, alguns de nós com responsabilidades institucionais nas regiões e nas
mais representativas associações empresariais portuguesas, queremos alertá-la para
o risco de isso acontecer em Portugal, país periférico que tende a tornar-se uma
ilha ferroviária na Europa, devido ao sistemático atraso em adoptar a bitola
europeia (1435 mm) nas suas linhas internacionais. Esta situação privaria Portugal
de vias terrestres competitivas (para o que têm de ser interoperáveis em toda a
sua extensão) para o transporte de mercadorias de e para a maior parte da União
Europeia. Além disso, impediria a concorrência na operação ferroviária
internacional, relegando Portugal para uma situação de monopólio ferroviário,
como defende o Governo português, que já declarou que encara a diferença de
bitola para o resto da União Europeia como uma protecção natural contra a
concorrência.
Esperamos,
por isso, que o novo TEN-T seja aproveitado para impulsionar uma transformação
na nossa infra-estrutura ferroviária no sentido da sua integração plena nas
redes europeias, sob pena de o nosso país ser a primeira “geografia do
descontentamento” e de destruição económica que descreveu com muita pertinência.
Chegaram
ao nosso conhecimento informações sobre a possibilidade de a Comissão Europeia certificar,
como interoperáveis no âmbito da Rede Core da União Europeia, vias férreas
portuguesas, em bitola ibérica (1668 mm), em itinerários do Corredor Atlântico
da Rede Core, cuja bitola não pode deixar de ser a que consta do Regulamento UE
1315/2013 (1435 mm).
Estamos
muito preocupados com essa possibilidade, que significa a manutenção do nosso
isolamento ferroviário relativamente a toda a Europa, nomeadamente ao TEN-T.
Julgamos,
antes de mais, que essa certificação iria contra os objectivos e afectaria a credibilidade
do novo TEN-T. Em lugar de um instrumento de modernização, reforço da
mobilidade e promoção da coesão económica, essa certificação iria, na prática,
converter o TEN-T num instrumento de justificação burocrática de um erro
histórico: contribuiria para a não
abertura à Europa do sistema ferroviário português, agravando assim as
condições logísticas dum país geograficamente periférico em relação ao centro
da Europa, pelo que representaria um dano, de consequências gravíssimas,
para a economia portuguesa.
Gostaríamos
de fundamentar esta pronúncia de acordo com dois critérios que apresentamos
neste documento, no anexo “Fundamentação”, constituído por 2 capítulos:
Primeiro,
o técnico-económico, capítulo onde a documentaremos sobre a preocupação de
grande parte do sector empresarial português com esta questão.
Segundo,
o jurídico, nos termos do qual essa certificação nos parece manifestamente
ilegal face à legislação europeia.
Pelo exposto, gostaríamos que nos informasse qual a
posição que a Comissão Europeia assumirá na questão da eventual certificação
como interoperáveis de linhas da Rede Core em bitola ibérica.
Com os melhores cumprimentos
Os subscritores
Luis Mira Amaral, ex Ministro da Indústria (1985-1995)
Mário Lopes – Engº civil, Prof. do Instituto Superior Técnico
(IST), Ex Presidente da Associação para o Desenvolvimento de Sistemas
Integrados de Transportes (ADFERSIT)
Arménio Matias - Engº electrotécnico, fundador e Ex Presidente da
Associação para o Desenvolvimento do Transporte Ferroviário (ADFER), Ex Administrador
da CP (Comboios de Portugal, https://www.cp.pt/institucional/pt/empresa)
Fernando Santos e Silva, Engº
electrotécnico, Ex responsável no Metropolitano de Lisboa pelos processos
de homologação dos novos troços
Joaquim
Polido, Ex Presidente da Fernave (http://www.fernave.pt/),
Ex Presidente da ADFERSIT, Ex quadro superior da CP
Luis
Cabral da Silva, Engº electrotécnico, gestor, Ex- quadro superior da REFER
(Rede Ferroviária Nacional, actual IP, https://www.infraestruturasdeportugal.pt/),
especialista em Transportes e Vias de Comunicação
Acúrcio
Santos, Engº electrotécnico, Ex-Director de material circulante e Ex Director dos
Serviços Regionais da CP
Alberto
Grossinho, Engº mecânico. Principais funcões desempenhadas na REFER (Rede Ferroviária
Nacional), entre 1970 e 2011: Director Geral Adjunto para a Segurança, Director
de Circulação, e elemento de ligação ao IMTT (Instituto da Mobilidade e
Transportes Terrestres) para as questões de interoperabilidade.
Mário
Ribeiro, Engº mecânico, Ex quadro superior da TAP no serviço de manutenção
Eugénio Menezes de Sequeira, Engº Agrónomo, Investigador
Coordenador aposentado do Instituto Nacional de Investigação Agrária, Ex
Presidente da Liga para a Protecção da Natureza, Membro da Comissão de Ambiente
da Sociedade de Geografia de Lisboa
Fernando
Mendes – Engº electrotécnico, empresário
Henrique
Neto, empresário
Vitor
Caldeirinha, Ex Presidente da Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra,
Ex Presidente da Associação de Portos de Portugal e Ex Presidente da ADFERSIT
João
Luis Mota Campos, Ex Secretário de Estado da Justiça (2002-2004)
José
Augusto Felício, Professor do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG)
João
Duque, Professor Catedrático do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG)
Carlos
Sousa Oliveira, Professor Catedrático Jubilado do Instituto
Superior Técnico (IST)
Rui
Carrilho Gomes, Professor do Instituto Superior
Técnico (IST)
António
Gomes Correia, Professor Catedrático da Universidade do Minho (UM)
José António Ferreira de Barros,, empresário, Ex Presidente
da AEP (Associação Empresarial de Portugal - https://www.aeportugal.pt/)
Luis Miguel Ribeiro,
Presidente da AEP (Associação Empresarial de Portugal, https://www.aeportugal.pt/)
Fernando
Castro, Presidente da AIDA, (Associação Industrial do Distrito de Aveiro, http://aida.pt/)
José
Couto, Presidente da AFIA (Associação dos Fabricantes para a Indústria
Automóvel, https://afia.pt/) e do CEC (Conselho
Empresarial do Centro, http://www.cec.org.pt/)
António
Miguel Batista Poças da Rosa, Presidente da NERLEI (Associação Empresarial da
Região de Leiria, https://www.nerlei.pt/)
Rogério Hilário, Vice-Presidente do CEC (Conselho
Empresarial do Centro, http://www.cec.org.pt/)
Tomás
Moreira (Ex Presidente da AFIA, Associação dos Fabricantes para a Indústria
Automóvel)
António
Almeida Henriques, Presidente da Câmara Municipal de Viseu (http://www.cm-viseu.pt/)
José Ribau Esteves, Presiente da Câmara Municipal de Aveiro (https://www.cm-aveiro.pt/)
Ricardo Rio, Presidente da Câmara Municipal de Braga (https://www.cm-braga.pt/pt)
PS Juntam-se num
documento separado, intitulado “Lista de emails” os emails dos subscritores
desta carta, para que os Serviços da Comissão possam verificar a veracidade da
lista de subscritores se o desejarem. Caso os Serviços da Comissão façam esta
verificação, pedimos que o façam individualmente, para manter a privacidade dos
subscritores no que diz respeito aos respectivos endereços electrónicos.
Anexo
Fundamentação
1
– Fundamentação técnico-económica
- Face aos constrangimentos ambientais e energéticos que a
Humanidade enfrenta, a União Europeia promove políticas para garantir a
sustentabilidade do sistema de transportes na Europa com base em 2 tipos de
políticas: i) desenvolvimento de veículos ambiental e energeticamente mais
eficientes em todos os modos de transportes, e ii) transferência de tráfego dos
modos ambiental e energeticamente menos eficientes e menos sustentáveis, para
os mais sustentáveis e eficientes. Este objectivo está quantificado pela UE: até
2030 transferir 30% e até 2050 transferir
50% do tráfego de mercadorias nas médias e longas distâncias (>300km) para os
modos ferroviário e marítimo (https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:52011DC0144&from=PT, ponto 2.5 (3)).
- Cerca de 70% do comércio externo de Portugal faz-se com
os seus parceiros da UE. Deste, cerca de 80% em valor faz-se por rodovia. O
transporte ferroviário internacional de mercadorias de e para Portugal faz-se
exclusivamente com Espanha e é uma parte muito
diminuta das trocas comerciais terrestres (Espanha possui uma rede ferroviária convencional
em bitola ibérica, embora planeie a sua migração para a bitola europeia). Ou
seja, actualmente Portugal depende muito fortemente da rodovia para as suas
ligações comerciais à UE, e estas são fundamentais para o desenvolvimento
económico. Como este sistema é insustentável face aos constrangimentos
energéticos e ambientais e às políticas europeias de transporte, sem uma
alternativa competitiva à rodovia Portugal ficará isolado dos mercados da UE, e
dessa forma condenado ao empobrecimento.
- Muitas empresas e Associações empresariais portuguesas
têm consciência do problema (http://cip.org.pt/wp-content/uploads/2018/03/Conselho_Industria_Portuguesa_final-LR.pdf., capítulo VI). Algumas como a AFIA (Associação de
Fabricantes para a Indústria Automóvel), antevendo esse isolamento têm
recomendado às empresas suas associadas que se preparem para usar as
plataformas logísticas espanholas de
Vigo, Salamanca e Badajoz, que se irão ligar à rede ferroviária de
bitola europeia, para exportar para o centro da Europa. (https://1drv.ms/b/s!Al9_rthOlbweun2b8KdQXWfHJnHR?e=wgzoGu), num processo de minimização de danos mas com
inevitáveis custos de contexto acrescidos em relação a outras empresas europeias
suas concorrentes.
- A ferrovia europeia é pouco competitiva no transporte
internacional de mercadorias e detém baixas quotas de mercado. Uma das principais
causas desta situação é o facto de ser gerida essencialmente a nível nacional,
por vezes com a preocupação de evitar a concorrência de outros países da U.E., utilizando para isso obstáculos técnicos
à circulação de comboios e/ou criando dificuldades na atribuição de canais
horários a comboios de outros países, naquilo que pode ser considerado uma
restrição de efeito equivalente a restrição de acesso aos mercados nacionais.
- As diferenças de bitola são o mais forte obstáculo
técnico à circulação de comboios. Os transbordos, o principal meio de resolver
este problema, além de fazerem perder tempo e dinheiro, tornam a gestão do
sistema ferroviário ineficaz devido à necessidade de compatibilização de canais
horários de comboios diferentes em redes com bitolas diferentes, para minimizar
essas perdas de tempo. Por isso, o tráfego ferroviário internacional de
mercadorias entre Portugal e a Europa além Pirinéus é de zero toneladas anuais.
Além disso, em grandes quantidades, necessárias à transferência modal em larga
escala como é objectivo das políticas europeias, a ineficácia de gestão
inviabiliza o funcionamento do sistema com um mínimo de competitividade.
- A utilização de eixos de largura variável em vagões de
mercadorias também não é uma solução competitiva para transporte de
mercadorias, além de serem material não standard, o que traz numerosos outros
inconvenientes. Aliás os próprios fabricantes espanhóis desses eixos referem
que estes eixos não servem para tornar desnecessária a migração da bitola em Espanha
mas servem para agilizar o transporte durante o período de transição em que coexistirão
em Espanha a bitola ibérica (1668mm) e a bitola UIC (1435mm) (https://www.civil.ist.utl.pt/~mlopes/conteudos/Transportes/Ref%20120%20-%20EIXOS%20VARIAVEIS%20para%20MERCADORIAS%20Ponencia-Eje-OGI.pdf, página 2)
- A via marítima pode contribuir para resolver uma parte do
problema do comércio de Portugal com a UE mas não a maior parte, pois é menos
competitiva que as vias terrestres no comércio Portugal-UE para muitos sectores
de actividade e origens/destinos no centro da Europa (Anexo 2 do documento
disponível em http://cip.org.pt/wp-content/uploads/2018/03/Conselho_Industria_Portuguesa_final-LR.pdf.,)
- Está explícito
em documentos da União Europeia (White paper – ‘European transport policy for
2010: time to decide, págs 29 e 30, disponível em https://ec.europa.eu/transport/sites/transport/files/themes/strategies/doc/2001_white_paper/lb_com_2001_0370_en.pdf ) que o transporte
ferroviário só pode ser competitivo se não existirem obstáculos técnicos à
circulação de comboios, o que é inteiramente correcto. Por esta razão a
Comissão Europeia tem definido políticas para a criação de um conjunto de
Corredores de grande tráfego, a Rede Core da UE, que devem ser servidos por
vias férreas interoperáveis, isto é, sem obstáculos técnicos à livre circulação
de comboios.
-
Neste contexto a
competitividade futura da economia portuguesa depende da criação das Linhas da
Rede Core da UE, incluindo obviamente os troços em território português.
- A possível certificação como interoperável de linhas de
bitola ibérica nos itinerários da Rede Core situados em Portugal estimula a
Governo português a adiar indefinidamente os investimentos em linhas de bitola
europeia, pois continua a ter acesso aos Fundos da UE para a Rede Core. Com a
agravante de em Portugal, devido à sua bitola ibérica, os comboios europeus
estarem impossibilitados de nos trazer e de levarem as mercadorias de que
necessitamos e que exportamos, ficando reféns de um monopólio que os actuais
operadores não querem perder e, consequentemente, não beneficiando da livre
concorrência internacional.
- A questão da continuidade em Espanha (não teria sentido
construir os troços portugueses das linhas internacionais de bitola europeia se
não tivessem continuidade em Espanha) deve ser resolvida com acordos prévios
tri-partidos Portugal-Espanha-UE sobre financiamento, características técnicas
e construção simultânea das linhas internacionais em ambos os países.
- Alguns responsáveis portugueses tentam desvalorizar a
questão, dizendo que depois da Espanha chegar com a ferrovia de bitola europeia
às fronteiras portuguesas, Portugal procederá à mudança da bitola na rede
portuguesa de um dia para o outro. Basta analisar a questão, numa perspectiva
técnico-económica, para se perceber que esta afirmação é totalmente irrealista.
Veja-se o caso da Espanha, que sempre teve a bitola europeia do lado francês
nas suas fronteiras a norte, começou a construir a rede de bitola europeia em
1988 e, apesar disso, o processo para colocar a bitola europeia em toda a
Espanha ainda vai demorar. Pior do que isso, o anterior Ministro das
Infraestruturas de Portugal, ao explicar a política do Governo para a ferrovia,
declarou que as diferenças de bitola para o resto da Europa são uma protecção
natural contra a concorrência externa (https://www.tsf.pt/economia/para-que-serve-parceria-da-cp-com-renfe-evitar-roubo-da-operacao-portuguesa-10038758.html e 3º vídeo do site https://www.dinheirovivo.pt/entrevistas/capacidade-de-transporte-aereo-em-lisboa-vai-duplicar/), pois sabe que dificilmente alguma empresa da Europa
além-Pirinéus comprará vagões de mercadorias não standard apenas para fazer os
trajectos na rede portuguesa.
- É também relevante referir que a Comissão Europeia já
chamou a atenção para a necessidade de Portugal trabalhar no sentido da
transição para a bitola UIC na rede ferroviária portuguesa (https://ec.europa.eu/transport/sites/transport/files/2019-transport-in-the-eu-current-trends-and-issues.pdf, página 128, e https://ec.europa.eu/info/sites/info/files/2020-european_semester_country-report-portugal_pt.pdf, página 66), embora sem exercer pressão ou estímulos
nesse sentido.
- Acresce que o isolamento ferroviário de Portugal, e
eventualmente de algumas regiões de Espanha ainda sem linhas de bitola europeia
aptas para tráfego competitivo de mercadorias, estimularia o uso da rodovia
para transporte de mercadorias nas médias e longas distâncias, o que iria
contra a competitividade da indústria e as metas de redução de emissões de gases de efeito de estufa
até 2030 e neutralidade climática até 2050 fixadas pela Comissão Europeia (https://eur-lex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:b828d165-1c22-11ea-8c1f-01aa75ed71a1.0008.02/DOC_1&format=PDF, páginas 5 e 6), preocupação que já chegou ao Tribunal de Contas da UE dados os
atrasos na construção e ineficiências da Rede Core (https://www.eca.europa.eu/Lists/ECADocuments/INSR18_19/INSR_HIGH_SPEED_RAIL_PT.pdf, 2nd paragraph)
2
– Fundamentação jurídica
- Recordamos a definição de interoperabilidade na Directiva
2008/57 e no nº2 do art.º 2 da Directiva 2016/797 (https://eur-lex.europa.eu/legal-content/pt/TXT/?uri=CELEX:32016L0797): “a interoperabilidade permite a circulação segura sem
interrupções”. Recordamos também o Regulamento 1315/2013 (https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/ALL/?uri=CELEX:32013R1315), que no Capítulo III, “Rede Principal” no artº 39
“Requisitos da infra-estrutura” estabelece no nº2 o seguinte:
” A
infra-estrutura da rede principal deve cumprir os seguintes requisitos:
a)
No que se refere à infraestrutura de
transporte ferroviário:
i) plena electrificação das vias férreas e,
desde que necessário para operações com comboios eléctricos, dos ramais,
ii) linhas de
transporte de mercadorias da rede principal conforme indicado no Anexo I: no
mínimo, 22,5 t de carga por eixo, 100 km/h de velocidade e a possibilidade de
circulação de comboios com 740 m de comprimento,
iii) plena
implantação do ERTMS,
iv) bitola nominal da via para as novas linhas
ferroviárias: 1 435 mm, excepto nos casos em que a nova linha seja uma extensão
de uma rede cuja bitola seja diferente e separada da das principais linhas da
União. “
- Decorre do ponto anterior, que como os troços da Rede
Core em território português não são separados das principais linhas da União
(a própria Rede Core de que fazem parte), têm de ser necessariamente em bitola
de 1435mm.
- O gestor da infra-estrutura ferroviária portuguesa (IP)
informou recentemente que o troço Évora-Caia da Linha Lisboa-Madrid do Corredor
Atlântico da Rede Core, actualmente em construção e que será dotado de uma via
única em bitola ibérica com travessas de dupla fixação, será certificado como
interoperável pela Associação Portuguesa para a Normalização e Certificação
Ferroviária (APNCF), num
processo que afirma ser reconhecido pela Comissão Europeia (notícias em https://webrails.tv/tv/?p=43721 e http://webrails.tv/tv/?p=43699). Realçamos que uma linha em bitola ibérica, seja lá
qual for o tipo de travessas, não é, na realidade, interoperável com as
restantes linhas da Rede Core, porque comboios de eixos fixos não poderão
transitar dessa linha para as restantes linhas da Rede Core.
-
Contactámos por email
a APNCF para esclarecer a questão da certificação. Recebemos resposta do
Secretário-Geral da APNCF, Engº Eduardo
Osvaldo Louro da Silva Correia, por
email no dia 9 de Junho de 2020. Transcrevemos de seguida
as partes relevantes da resposta:
“A certificação da interoperabilidade decorre ao abrigo da Directiva 2008/57/CE do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Junho de 2008, relativo à interoperabilidade
do sistema ferroviário na Comunidade, transposta pelo Decreto-Lei n.º 27/2011,
de 17 de Fevereiro, e pelas seguintes alterações:
………..
Ora, a Especificação Técnica de Interoperabilidade para o subsistema
«infra-estrutura» (Regulamento (UE) N.º 1299/2014, disponível em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:32014R1299&from=PT) estabelece no n.º 5 do Artigo 2.º que a ETI aplica-se às linhas com as
seguintes bitolas nominais: 1435 mm, 1520 mm, 1524 mm, 1600 mm e 1668 mm, sem
especificar o tipo de travessa, logo é aplicável à bitola ibérica
independentemente da travessa utilizada, permitindo consequentemente a
certificação da interoperabilidade ao abrigo da regulamentação europeia,
estando assegurado o reconhecimento dessa certificação e consequentemente o
financiamento europeu das linhas da rede Core em Portugal.
………..
Na verdade, os termos do Regulamento (UE) N.º 1299/2014, que revogou as
Decisões 2008/217/CE e 2011/275/EU, (……), pois tendo passado a prever
expressamente a bitola de 1668 mm, o financiamento passou a estar assegurado, o
que não era líquido nos termos regulamentares anteriores.” [fim de citação]
- Note-se que o Regulamento (UE) N.º 1299/2014 refere no art.º 11
“Revogação” que “As Decisões 2008/217/CE e 2011/275/UE da Comissão são
revogadas, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2015”, ou seja, o Regulamento 1315/2013
não foi revogado, Desta forma, no nosso entender e em
relação à Rede Principal [1] ou
rede Core, cujos requisitos estão previstos no artigo 39º, já citado, do
Regulamento 1315/2013, mantém-se inalterada a regra prevista no artigo 39º de
que « iv) bitola nominal da via para as novas linhas
ferroviárias: 1 435 mm, excepto nos casos em que a nova linha seja uma extensão
de uma rede cuja bitola seja diferente e separada da das principais linhas da
União.».
- A manutenção da situação excepcional
da actual rede portuguesa tem na verdade um “racional” que está em contradição
directa com os propósitos da política da União nesta e noutras matérias: como
já se referiu, em entrevista à estação de rádio TSF em 20 de Outubro de 2018, o
então Ministro das Infraestruturas e agora deputado europeu Pedro Marques, afirmava,
no contexto do livre acesso às redes de
transporte ferroviário de passageiros na União Europeia, decidido em 2013, que será
concretizado no início do próximo ano, que parte
da concorrência, no entanto, é afastada à partida por haver uma "protecção
natural": a bitola ibérica. Acresce, como já referido, que para além da profunda
contradição desta posição anticoncorrencial, que visa estabelecer uma restrição
de efeitos equivalentes a uma proibição da concorrência no mercado português,
decorrem da politica resultante desta posição consequências graves para os
exportadores portugueses (e europeus no seu conjunto, quando exportadores para
Portugal) que, para que os operadores ferroviários locais sejam protegidos no
seu mercado natural, se vêem prejudicados na capacidade de fazer circular as
mercadorias sem entraves no espaço económico europeu.
-
É assim
sustentável que a certificação como interoperáveis no âmbito da Rede Core da
União Europeia das vias férreas portuguesas, em bitola ibérica (1668 mm), em
itinerários do Corredor Atlântico da Rede Core, viola os princípios contidos no
artigo 170º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE, https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=celex%3A12012E%2FTXT) e, mais concretamente a proibição de auxílios que afectem as
trocas comerciais entre os Estados-membros contida no artigo 107º, 1, do
TFUE [2],
na medida em que é muito claro que a manutenção da bitola ibérica, de acordo
com as próprias declarações do Governo Português, visa proteger a CP da
concorrência [3],
criando uma barreira artificial de protecção do incumbente em detrimento de
potenciais concorrentes.
-
Cabe à
Comissão Europeia, nos termos do artigo 108º do TFUE, controlar a
compatibilidade deste auxílio com o mercado interno, sendo nosso entendimento
que para além do enorme prejuízo que esta forma de ajuda à CP causa à economia
portuguesa, viola as regras de concorrência e livre acesso ao mercado impostas
pelos Tratados.
[1] Artº 38º, 1, do Regulamento
1315/2013: A
rede principal, ilustrada nos mapas contidos no Anexo I, é constituída pelas
partes da rede global que têm maior importância estratégica para a consecução
dos objectivos da política de desenvolvimento da rede transeuropeia de
transportes, e deve reflectir a evolução da procura de tráfego e as
necessidades de transporte multimodal. A rede principal deve contribuir,
nomeadamente, para dar resposta à mobilidade crescente, para garantir elevados
padrões de segurança e para desenvolver um sistema de transportes com baixo
teor de carbono.
[2] Artigo 107º (ex-artigo 87º TCE) 1.
Salvo disposição em contrário dos Tratados, são incompatíveis com o mercado
interno, na medida em que afectem as trocas comerciais entre os
Estados-Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de
recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou
ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas
produções.
[3] Deixando aliás implícito um entendimento com a RENFE espanhola. Cfr. entrevista de 20 de Outubro de 2018, já citada.Exma. Senhora
....................................................................................................................................................................
Dado conhecimento da carta a deputados e à comunicação social, veio a ser dada noticia através da Lusa:
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